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O VAQUEIRO E O DIABO
Álvares de Azevedo
Ao entrar na venda, encontrou-se com Cosme Theodoro, Toroco e Felipe Cana Doce. Tomaram a princípio, algumas lapadas de chica-boa e vinho de jurubeba. Cosme Theodoro comprou um litro de querosene, café em grãos, sal, sabão, anil, alguns metros de bulgariana e retirou-se, acompanhado por Toroco e Lunguinho Frajola, debaixo de protesto dos amigos, que diziam:
– Véi Cosme, é cedo ainda, home, vamo come água. Num vai agora, não.
Felipe Cana Doce e Zé Coco que estavam já calibrados, viram Timóteo Morubichumbo, Zé Pevide e João Cachorro, todos já altamente alcoolizados e redobraram as doses de chica-boa, agora misturadas com rabo-de-galo, conhaque e outros destilados.
João Cachorro, que era muito arreliento, logo começou a dizer:
– Aqui, nessa cabeça-de-porco não tem homem, pois se tivesse pulava em mim, pra ver com quantos paus se faz uma cangalha.
Zé Coço, arrogante, forte e soberbo que nem uma mula, tomou a provocação na unha e deu um trompaço tão grenado em João Cachorro, que o colocou por terra.
Aí, se pôs a contar garganta e a desacatar tudo e todos. Em pouco tempo estava sozinho, os amigos fugiram antes de serem envolvidos em suas arengas. Zé Coco batia na tábua dos peitos e dizia com toda arrogância do mundo:
— Aqui nessa desgraça não tem homem que enfrente Zé Coco. Zé Coco é macho e não maxixe. Do modo que estou enfrento até o capeta, se ele quiser ver que apareça. Vem capeta, se é que você existe. Vem, vem!
A Nega Valei-me tinha uma barraca de comida na feira e se encarregou de dar uma xícara de café sem açúcar ao valentão que, após sorver o amargoso líquido, melhorou um pouco. Sentou-se num banco que havia debaixo de um pé de umbuzeiro da praça, descansou um bom tempo, montou no seu cavalo e seguiu viagem.
No lusco-fusco da tarde, precisamente ao se aproximar de uma encruzilhada, perto do Rio das Voltas, pois ia para Malhadinha, começou a sentir um forte odor de enxofre queimando e logo em seguida o tropel de um animal em disparada. O capiau ficou atento e logo apareceu à sua frente um homem branco, de olhos azuis, muito bem apessoado e puxou conversa. Falava bem e após algumas palavras, retesou-se todo, passou a soltar fogo pelas ventas e perguntou:
– Você sabe quem sou eu?
– Sei não, sinhô - disse Zé Coco acovardado, num verdadeiro cagaço.
– Pois fique sabendo que sou o diabo, a quem você chamou há pouco, na feira de Curiapeba.
– Tesconjuro — disse o matuto.
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